Marco Antonio Corrêa é um dos principais especialistas da Tetra Tech América do Sul.
São mais de 20 anos de experiência em gerenciamento de projetos nas áreas de oceanografia física, meteorologia, hidrologia, entre outros. Líder técnico de Recursos Hídricos na Tetra Tech, Marco Antonio possui mestrado e doutorado em Oceanografia Física pelo Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP), com graduação em Física pela Faculdade Oswaldo Cruz.
Como os avanços tecnológicos e computacionais atuais (Big Data, Machine Learning, IoT, entre outros) têm sido utilizados nos estudos hidrológicos e hidráulicos?
Atualmente utilizamos técnicas de Machine Learning e clusterização em análises de previsões meteorológica e de agitação marítima. O objetivo destas análises é melhorar o nível de acerto dos modelos numéricos de previsão de vento e ondas, sendo que, até o momento, as taxas de acerto mensal têm ficado em torno de 89%, considerando todas as áreas e as duas variáveis.
Se considerarmos que as duas grandezas físicas analisadas, vetor e ondas, estão relacionados a fenômenos essencialmente caóticos, acertar a previsão em quase 90% das vezes é resultado muito positivo. Além disso, continuamente temos aplicado novos testes e ajustes para tentar aumentar o nível de acerto.
Em sua opinião, quais são as principais lacunas de conhecimento ou áreas de pesquisa emergentes no campo da hidrologia e da hidrodinâmica que merecem mais atenção e investimento no futuro?
Algumas das áreas que merecem atenção e estão diretamente relacionadas aos estudos que realizamos são a Modelagem de Extremos Hidrológicos, a Interação entre Água Urbana e Superficial, e a Gestão de Águas Urbanas.
A primeira se justifica, pois, com as mudanças climáticas, há uma necessidade crescente de entender e modelar eventos extremos com maior precisão e resolução espacial e temporal, incluindo a utilização de modelagem climática de médio e longo período.
A interação entre Água Urbana e Subterrâneas é crucial para uma gestão sustentável dos recursos hídricos, promovendo uma compreensão mais profunda sobre como elas se conectam e impactam mutuamente.
Por fim, a Gestão de Águas Urbanas existe devido à necessidade de desenvolver abordagens integradas para gerenciar e mitigar os impactos das enchentes urbanas. Neste contexto incluem-se, também, as soluções baseadas na natureza (SBN). Em estudos que realizamos recentemente para o Plano Diretor de Águas Urbanas no Espírito Santo, envolvendo sete municípios da Grande Vitória, utilizamos a aplicação de SBN para simulações/projetos conceituais de jardins de chuva, parques lineares, re-naturalização de rios etc.
Investimentos e pesquisas nessas áreas são essenciais para avançar nosso entendimento da hidrologia e da hidrodinâmica e para desenvolver soluções sustentáveis para os desafios hídricos que enfrentamos atualmente e no futuro.
Como as mudanças climáticas globais podem ser incorporadas nos estudos de macrodrenagens e disponibilidade hídrica para as principais cidades do Brasil e do mundo?
Os estudos de modelagem hidrológica fornecem, entre outros resultados, a determinação das manchas de inundação em áreas urbanas, rurais e litorâneas.
A modelagem pode ser utilizada também para simular o comportamento e o efeito de sistemas de drenagem, de obras de infraestrutura e, principalmente, de estruturas hidráulicas que visam reduzir ou eliminar o efeito das inundações.
O dimensionamento destas estruturas considera a frequência (probabilidade de ocorrência) e intensidade (extensão e altura da lâmina d’água) nos locais de inundação. Para conhecer estes dois parâmetros (frequência e intensidade) são realizados estudos estatísticos que utilizam os registros históricos das ocorrências.
As análises dos registros podem, eventualmente, mostrar a existência de tendências de aumentos na frequência e intensidade das inundações e, em alguns casos, relacionadas aos efeitos das mudanças climáticas globais. A análises destas tendências fornecem um indicativo do comportamento futuro do sistema e auxiliam na elaboração de projetos e de tomadas de decisão.
Quando falamos de inundações, o problema a ser resolvido é onde colocar o excesso de água. Mas, existe o problema inverso, o que fazer quando falta água. Os estudos de disponibilidade hídrica também envolvem modelagem hidrológica, hidrodinâmica e análise de dados e, assim como os estudos de drenagem, a disponibilidade também é afetada pelas mudanças climáticas globais.
Ao implementar modelos numéricos para simular processos hidrodinâmicos e de qualidade da água, como você aborda a seleção de parâmetros e a calibração do modelo para garantir uma representação precisa do sistema?
Nós realizamos estudos de qualidade d’água em vários ambientes tais como, rios, lagos, reservatórios, baías, estuários, região costeira etc.
Estes estudos avaliam vários parâmetros físicos, químicos e microbiológicos. Nestes estudos são realizadas análise de dados e modelagens numéricas. A ideia de usar os modelos é prever o que pode ocorrer com o meio ambiente caso alguma alteração seja introduzida no sistema. No caso específico de qualidade d’água, esta alteração pode ser um lançamento projetado de efluente (domésticos, sanitário, industrial, etc.), ou um acidente, como, por exemplo, um vazamento de produtos químicos.
A precisão (capacidade de acerto) da previsão do que pode ocorrer com o meio ambiente é diretamente dependente da qualidade das informações utilizadas.
Para garantir que os resultados das simulações reproduzam a realidade, é necessário comparar os valores calculados pelos modelos com os valores observados no campo. A primeira fase, ou etapa, de comparação é o que chamamos de calibração do modelo. Após calibrarmos e, se houver dados em outras posições da região que está sendo modelada, e/ou outros períodos de medição, nós comparamos os resultados obtidos após a calibração com estes outros dados. Esta segunda etapa é chamada de validação. Após o modelo estar calibrado e validado estamos seguro para afirmar que os resultados fornecidos reproduzem a realidade dos fenômenos que estão sendo investigados.
Em geral, procuramos sempre esgotar todas as fontes de informações disponíveis sobre o local de estudo e estressar ao máximo as análises das informações. O nosso objetivo principal é fornecer aos clientes e aos órgãos ambientais uma visão clara e segura das consequências ambientais das interferências estudadas. Nos preocupamos também em garantir que os resultados possam ser reproduzidos pelos clientes, outros consultores e/ou órgão ambientais envolvidos.
Nesses mais de 20 anos de carreira, é certo que centenas de projetos foram executados. Qual deles foi o mais desafiador na sua opinião? Como você lida quando enfrenta problemas complexos como esse?
Na verdade, todo novo estudo oferece algum nível de desafio. Praticamente não existe estudo repetido. Todos exigem uma análise do ambiente, do efluente, da operação, das condições extremas etc. A melhor forma de encarar os eventuais desafios é considerá-los como uma nova oportunidade de aprendizado e crescimento tanto pessoal, como para a empresa.